quinta-feira, setembro 29, 2005

Praia do Icaraí























Na Praia do Icaraí, Paulinho da Viola encerrava a semana do chorinho no Rio de Janeiro cidade maravilhosa, no dia do santo guerreiro, na praia de Icaraí. Começou bem, obrigado, sob uma lua mais do que cheia, cheíssima. Não mais que de repente, a festa foi abençoada por uma tempestade de água benta, vinda diretamente dos batistérios do céu deste Brasil varonil. A multidão espalhada pela areia da noite musical não teve alternativa senão a fuga desordenada, qual formiguinhas assustadas diante da corredeira de açúcar derramada por um açucareiro desastrado. Os sem-teto secos, amantes do artista, abrigaram-se sob os edifícios da maneira que puderam e continuaram a ouvir o samba de viola do Paulinho o qual, por sua vez, impávido como a própria natureza, lá continuou na tranqüilidade que lhe é peculiar feito um Jorge sem medo de dragões ou tisunamis. E cantou. Lindamente!


Eu, preguiçosamente revoltada com a avalanche de camelôs que, inaugurando uma nova tradição no show-business da terra de Araribóia, inundaram a praia com suas ondas de gigantescas barracas feito árabes no deserto e me reservei o direito à sobrevivência contententando-me com a janela de minha tenda na categoria de uma espectadora que não vê (talvez ouvidoura fosse mais correto, se é que esta palavra seja de possível ocorrência). Até porque não daria para ser diferente, já que os aparelhos sonoros quando acionados em sua máxima potência, tornam-se gigantescos amplificadores auditivos para uso daqueles que como eu, candidatam-se nestes dias festivos a uma surdez galopante. Na praia do Icaraí - o do Icaraí é por honra e mérito do noticiário da BandNews sobre o evento - ainda somos aborígines vivendo nas grandes ocas de concreto armado da província de Nikiti. De qualquer forma, entre chuvas e notas musicais, a festa une e re-une toda a tribo, a fim de se cantar a Tupã.


Eventos assim me remetem a infância onde, nos salões da paróquia onde cresci, meu tio libânes, maronita, cristão e congregado mariano, reunia as grandes estrelas da música da década de 60 (e fins de 50), para o deleite da tribo desta época. Diferentes tribos, semelhantes rituais! Vi passar pela minha infância Jackson do Pandeiro com sua altíssima Almira, Ellen de Lima, Ângela Maria e outros dos quais não posso me lembrar agora porque memória de criança é curta, pois não? Imagina só!


Quem poderia dizer que eu, hoje cheia de seletismos musicais, já arrastei um bocado meu corpo ao ritmo de forrós, chá-chá-chás, twists e por aí afora... Pois é. Todo mundo já pecou alguma vez. Mas entre pecados e prazeres vamos traçando as linhas desta sinfonia saudosa, porque eu estou vestida com as roupas e as armas de Jorge, para que meus inimigos tenham pés e não me alcancem, já que não sou boba nem nada.

Fotografia: Joaquim da Cunha Bueno Marques (homenagem póstuma).